[Opinião] Os desafios de Sam Kerr na competitiva Europa

Não foi nenhuma surpresa a atacante Sam Kerr assinar pelo Chelsea. Os rumores já circulavam desde a Copa do Mundo, com alguns veículos até cogitando a chegada da australiana no Tacón (futuro – quem sabe – Real Madrid). Surto coletivo a parte, Kerr é dos Blues, e vai começar a trilhar seu caminho no competitivo futebol feminino europeu.

Deixando de lado toda a animosidade que você possa – ou não – ter pela jogadora, vamos aqui analisar os fatos que pesam para Kerr e para o Chelsea nessa nova jornada.

Aos 26 anos, Sam Kerr é sem duvidas uma das maiores jogadoras australianas de todos os tempos. Sem exagero. Fez sua estreia profissional aos 15 anos, conviveu com lendas do futebol feminino no seu país como Sarah Walsh e Lisa De Vanna, a última ainda em atividade, mas infelizmente em decadência.

Com 83 jogos vestindo a camisa das Matildas, Kerr já marcou 38 gols. O problema é na hora de decidir. O pênalti perdido na Copa do Mundo vai assombrar a carreira da atacante por muitos anos, ou até que ela consiga se redimir.

Pelos clubes por onde passou, sempre foi protagonista. Perth Glory, Sydney FC, Western New York Flash, Sky Blue e Chicago Red Stars. Foi nos Estados Unidos que sua carreira decolou de vez. Depois de 72 jogos e 56 gols, a NWSL ficou pequena para Sam Kerr.

A falta de títulos incomoda. No Chelsea, a atacante chega com objetivo de conquistar taças, jogar a Liga dos Campeões, ser campeã da liga mais competitiva do mundo, nas palavras dela. Os Blues depositam confiança com um contrato extenso: dois anos e meio. Ou seja, a metade da atual temporada e as duas próximas. Tempo suficiente para o Chelsea voltar a Champions e… conquistá-la?

Os primeiros desafios

Na Europa, a vida de Kerr não será fácil. Primeiro, existe a adaptação ao novo estilo de jogo e ao novo estilo de vida. Em janeiro a atacante está acostumada a aproveitar o conforto da liga australiana e suas temperaturas amigáveis. Pois ela que se prepare, porque esse promete ser um inverno frio em Londres.

Além disso, o Chelsea é um time que acaba de encontrar sua formação ideal. A técnica Emma Hayes, experiente e que tem total apoio da diretoria, pode fazer o que bem entender, desde colocar no banco a estrela do time, até contratar uma jovem desconhecida e torná-la ídolo do time.

Analisando apenas os jogos da WSL, o Chelsea se encontrou no 442 (ou 4222). Hayes tentou fazer o 433 funcionar, mas Spence não conseguiu dar ritmo ao meio de campo, que acabou sofrendo para vencer o Tottenham na estreia e empatou com o modesto Brighton na rodada seguinte. O 442 surge na terceira rodada. Spence deu lugar a Kirby, que faz muito bem o papel de falso 9, e o time conquistou sua primeira goleada.

Ainda faltava uma peça importante na equipe, que finalmente voltou a jogar quando o time mais precisava. O Chelsea ia empatando em casa com o Arsenal, rival direto pelo título e por vaga na Liga dos Campeões, até que Hayes lançou Bachmann e Thorisdottir em campo. Assistencia da primeira, gol da segunda, 2 a 1 que mostrou o caminho a seguir.

Bachmann era quem faltava. Kirby perdeu espaço, ainda recuperando o ritmo depois de lesão, e ficou inclusive de fora da última convocação da Inglaterra. Bachmann é uma das três partes do enredo Sam Kerr. Depois de entrar no segundo tempo contra o Arsenal, a atacante suíça recuperou sua vaga como titular da equipe. Foi motivada para os amistosos de sua seleção e não decepcionou. Ela mostra que será tão importante para o Chelsea como na última temporada, quando foi uma das melhores jogadoras da equipe.

Hoje, a base do time do Chelsea é:

Berger; Mjelde, Bright, Eriksson, Andersson; Ingle, Cuthbert, Ji, Reiten; Bachmann e England.

A terceira peça é justamente Bethany England. Ela, Ji, Reiten e Ingle são titulares absolutas da equipe. Disputaram todas as partidas da WSL até aqui, mesmo quando Hayes decidiu mexer na estrutura tática do time. A defesa está consolidada, com Mjelde, Bright, Eriksson, Andersson, e Ingle como volante. Ou seja, resta apenas uma vaga nesse time, que justamente passou a ser ocupada por Bachmann.

Para o lado de quem a corda vai arrebentar? É inevitável que se tudo correr bem, Kerr seja titular nesse time do Chelsea. As chances de England perder sua vaga no time são maiores que de Bachmann no auge da forma física (porque tática, meus amigos… fora de série).

Para o repórter do Planeta Futebol Feminino, Bruno Bezerra, o dilema de Emma Hayes para encaixar Sam Kerr não se resume só as duas peças do ataque. “A opção seria mudar o esquema tático, mas ela teria que mexer nas pontas. Como tirar Reiten ou Cuthbert do time, que estão jogando demais?”

Coragem

Sam Kerr que lute.

Sério, sem meme. A ida de Kerr pra Europa mostra que ela tem ambições maiores para sua carreira. Ficar na NWSL e depois jogar no quintal de casa na Autrália lhe traria os números, mas não a glória. Se você não faz parte da USWNT – ou não é a Marta – só mesmo jogando na Europa para chamar atenção no futebol feminino. E olha que até a Marta fez esse caminho!

Na Europa a competição de Kerr é contra a nata do futebol feminino, não só as americanas como na NWSL. O primeiro desafio será adaptação, o segundo assumir o posto de titular no Chelsea. O terceiro: mostrar que pode brilhar mais do que Vivianne Miedema na Inglaterra. O quarto, se conseguir ajudar o Chelsea a chegar na Liga dos Campeões, vai precisar barrar nomes como Pernille Harder e Ada Hegerberg. O quinto, e último, será tirar o estigma de pipoqueira que a persegue pela falta de títulos.

Portanto, sem ironias, parabéns pela coragem, Sam Kerr. Isso é competitivo sim!

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