Com o fim da She Believes Tour, campeonato preparatório para a Copa do Mundo da França, pudemos detectar sérias falhas individuais e coletivas que o time de Vadão apresentou diante da seleção americana.
A derrota para os Estados Unidos foi a oitava em nove jogos de Vadão contra times do Top 10 do Ranking da FIFA. Analisamos algumas falhas preocupantes em lances do jogo.
- A falta de compactação defensiva;
Um sistema defensivo compacto exige duas variáveis básicas. A primeira, é que as linhas de marcação (No caso do Brasil, o 4-3-3 ou o 4-4-2) estejam posicionadas a uma distância próxima e análoga. Dessa forma, quanto mais próximas as linhas estiverem, menos espaço o time adversário tem para jogar com a bola no chão. A segunda variável é que a distância entre cada uma das atletas dentro de uma mesma linha deve ser a mesma.
Na seleção brasileira, é possível identificar em diversos momentos essa tentativa de compactação, de forma bem crua. O momento de maior dificuldade de organização se dá o time é desarmado no campo de ataque. Existe uma grande problema de recomposição defensiva, algo que deve ser fortemente trabalhado pela comissão técnica há tempos. Parece que as atletas se afobam e não conseguem retomar sua posição defensiva de forma correta, causando um grande desequilíbrio.
Esse lance acontece logo após a zagueira Mônica ser pressionada e perder a bola para Alex Morgan. Morgan estava isolada na frente e, por isso, teve que recuar e recomeçar o jogo, o que deveria ter dado tempo o suficiente para o Brasil se organizar. Vejam o posicionamento das duas laterais brasileiras. Letícia está longe de Érika (próxima a atacante estadunidense), enquanto Andressa está extremamente próxima de Mônica. Esse posicionamento da Andressa, sem nenhum auxílio da ponta esquerda, que nem aparece no vídeo, abre um buraco pela parte esquerda da defesa do time, dando diversas possibilidades ofensivas para as adversárias.
2. A falta de amplitude ofensiva;
Ao escolher jogar com um esquema sem uma centro avante “clássica”, com quatro jogadoras mais móveis no ataque, é preciso se atentar a algo extremamente importante: a amplitude. Amplitude é a distância horizontal entre a atleta mais aberta de um lado e a atleta mais aberta do outro. A amplitude é vital nessas situações porque, quanto mais aberta uma ponta fica, mais espaço sobra para a infiltração das jogadoras que jogam mais por dentro. Se as jogadoras de frente estiverem muito próximas umas das outras, o trabalho da defesa é facilitado, porque basta defender o meio e dificilmente alguém conseguirá infiltrar.
Nesse lance, Marta está com a bola próxima a área. Reparem nas jogadoras mais avançadas, como elas estão bem próximas. Temos uma defensora para cada uma das atacantes. Com falta de opções de passe, Marta é obrigada a abrir a bola para a lateral Letícia, que cruza para uma área congestionada, o que dificilmente levará perigo.
Parte da falta de amplitude da seleção brasileira se dá por característica de jogadoras. Foram poucas as vezes que as pontas mais abertas buscaram a linha de fundo, dando mais profundidade ao time. Outro fator que prejudica a amplitude do Brasil é a dificuldade em que temos em sair jogando no meio de campo. Frequentemente vemos as pontas tendo que vir buscar jogo dos pés das volantes, isso porque não temos uma jogadora de meio de campo que busca e distribui essa bola com qualidade. Com as pontas mais recuadas e propondo o jogo, claro, dificulta muito que elas se tornem jogadoras abertas, abrindo esses espaços nas defesas.
3. Dificuldade de marcação pelas laterais, seguidos pela falta de cobertura;
As laterais foram um grande problema neste torneio. No jogo contra os Estados Unidos especificamente, Andressa Alves foi improvisada como lateral esquerda. Sua falta de experiência na posição foi muito gritante, principalmente na parte defensiva. Além de Andressa não ter o “feeling” de lateral, houveram muitos erros de cobertura por parte das volantes, o que parece ser um problema tático e não erros individuais de atletas.
Analisando um lance específico em que a defesa dos Estados Unidos afasta uma bola cruzada por Andressa Alves, que vai fazer a marcar por pressão em Tobin Heath, que quer sair jogando e acaba tocando para trás.
A seleção brasileira segue fazendo pressão, obrigando a zagueira americana a rifar a bola para frente. Formiga então, consegue uma bela interceptação. Porém, vejam o posicionamento das duas volantes brasileiras, nos quadrados em vermelho e da lateral Andressa, no quadrado em azul.
A bola fica com Andressa Alves, que toca para Thaisa. Andressa, que não é lateral de origem, se mantém no ataque, enquanto as duas volantes também estão próximas a ela.
Com isso, podemos prever que o lado esquerdo da defesa estará aberto, já que, na ausência da lateral, a volante deveria ser a responsável pela cobertura. Mas, como podemos ver, nossas duas volantes estão também no ataque. Thaisa é desarmada e observem o posicionamento de Andressa e de Formiga, muitos próximas e longe de estarem em uma posição boa para irem atrás de um contra-ataque.
Basta um passe simples de Julie Ertz para que Sam Mewis arme o contra-ataque completamente livre, numa situação de 4 contra 3.
Esses são alguns erros que deveriam ser revistos pela comissão técnica da seleção brasileira. O mais significativo é que as jogadoras saibam identificar dentro de campo essas possibilidades táticas que o jogo dá. Caso elas não consigam, o time fica extremamente previsível. É importante que hajam variações, desde que estas sejam feitas de forma organizada, e não com meros improvisos. É dever da comissão técnica preparar as meninas para todos os tipos de situações ofensivas e defensivas.