Ainda existe muita disparidade no futebol feminino. Se alguém duvidava, o 13 a 0 dos Estados Unidos sobre a Tailândia não deixou dúvidas. O time tailandês que tinha conseguido empatar na Copa da Ásia com a Austrália, foi obliterado pelas americanas no primeiro jogo do grupo F da Copa do Mundo.
Muitos foram até as redes sociais criticar a seleção dos Estados Unidos e sua falta de “piedade” pela Tailândia. Esse não é o foco principal dessa matéria, mas entender o que as duas partes acharam do placar elástico faz parte do contexto.
Logo após a partida a atacante Alex Morgan, autora de cinco dos 13 gols, falou em entrevista que o time queria “mostrar do que somos capazes”. O placar foi a maior goleada da história da Copa do Mundo feminina, superando o 11 a 0 da Alemanha sobre a Argentina em 2011. As americanas entraram em campo pensando em quebrar esse recorde, revelou a atacante Megan Rapinoe, autora de um dos gols. A justicativa da volante, que atuou como zagueira nessa partida, Julie Ertz, é de que o time se prepara do mesmo jeito para enfrentar todos os oponentes. “Levamos todos os nossos oponentes muito a sério. Nos preparamos da mesma forma. Treinamos com intensidade. E é assim que mostramos que não subestimamos nenhu adversário”, completou.
Do lado tailandês o sentimento foi de tristeza, com muitas jogadoras chorando dentro de campo após a partida. Já na zona mista, a técnica Nuengrutai Srathongvian aceitou o resultado. “Não fizemos o suficiente. Aceitamos que os Estados Unidos são um adversário muito forte e excelentes em todos os aspectos. Aceitamos nossos erros e vamos melhorar,” disse a treinadora que viu seu time levar 10 gols só na segunda etapa.
A culpa é dos Estados Unidos?
Não.
Para a Copa do Mundo de 2019, a FIFA distribuiu assim as 24 vagas:
- AFC (Ásia): 5 vagas
- CAF (África): 3 vagas
- CONCACAF (América do Norte, América Central e Caribe): 3 vagas
- CONMEBOL (América do Sul): 2 vagas
- OFC (Oceania): 1 vaga
- UEFA (Europa): 8 vagas
- País Sede: 1 vaga
- CONCACAF-CONMEBOL playoff: 1 vaga
O problema está aí, na distribuição de vagas. Mesmo com a Austrália levando uma vaga na Ásia, ainda restam outras quatro para serem preenchidas através da Copa da Ásia. Dividida em dois grupos de quatro times, o torneio dá quatro vagas para os times que chegam até a semifinal. A última vaga fica entre os dois terceiros colocados, que disputam um playoff em jogo único.
A Austrália joga na AFC por um acordo feito com a FIFA. Os times da Oceania achavam a seleção masculina australiana forte demais, além disso, a OFC no masculino não tem vaga direta para a Copa do Mundo. Num acordo que agradou a todos, disse o então presidente da FIFA Sepp Blatter, a Austrália pode “mudar de continente” e disputar a vaga contra os rivais asiáticos.
A Tailândia é apenas a 34º colocada no ranking da FIFA. No masculino a situação é ainda pior, 114ª posição. Fundada em 1916 e afiliada a FIFA desde 1925, a Federação Tailandesa de futebol pode passar a impressão desinteresse em melhorar as condições de jogo, tanto para mulheres, quanto para homens.
Mas será que é proposital? Simplesmente uma tentativa de minar o futebol no país? Não pode ser que simplesmente não existam recursos suficientes para financiar uma liga de futebol feminino, arcar com custos de amistosos internacionais, custos para reunir as jogadoras em um só lugar? Tudo isso custa dinheiro, e muito. A pergunta que fica é se a FIFA não deveria fazer mais por essas federações menores. O papel do órgão máximo do futebol não é mediar, fazer sorteios e organizar competições. É também oferecer apoio, suporte, investimento para o desenvolvimento do futebol.
Enquanto times como a Tailândia chegam a Copa do Mundo, equipes como o México, da CONCACAF, ficam de fora, sem levar em consideração o investimento, que apesar de recente, começa a dar resultados.
Outro bom exemplo está nas vagas destinadas à UEFA. Pensar que a Copa do Mundo, que deveria reunir os melhores times e jogadoras do planeta, não conta com Pernille Harder, atacante da Dinamarca, é difícil. Até mesmo na CONMEBOL, com apenas duas vagas diretas, seleções como a Colômbia em 2019, ficam de fora. A Argentina conseguiu retornar para o mundial depois de 12 anos, e isso através de um playoff disputado contra o Panamá.
O que dizem as jogadoras
Além das críticas, muitos saíram em defesa do placar largo dos Estados Unidos. Para a ex-atacante Abby Wambach, é preciso entender a empolgação de algumas jogadoras, que fazem sua estreia em mundiais.
For all that have issue with many goals: for some players this is there first World Cup goal, and they should be excited. Imagine it being you out there.This is your dream of playing and then scoring in a World Cup. Celebrate.Would you tell a men’s team to not score or celebrate?— Abby Wambach (@AbbyWambach) June 11, 2019
“Pra todos que tem problemas com tantos gols: para algumas jogadoras essa é seu primeiro gol em Copa do Mundo, e elas devem ficar felizes mesmo. Se imagine no lugar delas. Esse é seu sonho, de jogar e marcar numa Copa do Mundo. Comemorem. Você diria a um time de futebol masculino para não marcar ou comemorar?”
O tweet de Wambach levanta outros aspectos da discussão, que necessitariam de outra matéria para abordar. A ex-jogadora ainda mandou um recado para que a FIFA dê mais recursos a federações menores. Isso é válido. O papel da FIFA não é só mediar, é apoiar.
No final da goleada, a lateral Kelley O’Hara, dos Estados Unidos, falou sobre o placar. “No final do dia, não podemos nos sentir mal por ter marcado o máximo de gols possíveis em qualquer jogo que fizermos”. Ela está certa. O objetivo do jogo de futebol é simples: levar a bola do seu campo até o campo adversário e colocá-la dentro da baliza adversária. Resumindo: o objetivo do futebol é o gol.